segunda-feira, 28 de julho de 2008

O castelo

Do alto da mais alta torre de seu castelo, o gordo observava em silêncio as nuvens de agosto se aproximarem. Elas eram negras como a mais escura noite sem lua e pesadas como as culpas e os pecados que ele carregava sobre os ombros.
Calado, ele estava preocupado.

Mas, quando seus criados foram lhe alertar, ele, em sua arrogância, menosprezou a tempestade iminente e ridicularizou seus súditos como idiotas covardes por temerem o que ele disse ser apenas uma chuva qualquer que passaria logo sem causar nenhum estrago.
Eles tentaram argumentar que reparos emergenciais precisavam ser feitos em algumas partes da base da estrutura de sustentação do castelo, mas o gordo não os levou em consideração. Sempre foi assim.
O gordo, ou melhor, o Homem de Ouro, como ele gostava de ser chamado, sempre fazia as coisas do seu jeito. Raramente ouvia o que os outros tinham a dizer. Nunca levava em conta a opinião de seus criados. E quando se sentia pressionado, logo dizia: - Eu sou seu pastor, seu rei, seu mestre e façam a minha vontade imediatamente!
O gordo, como os seus súditos o chamavam entre eles, se retirou para os seus aposentos.

Os ventos já mudavam de direção. Ficavam mais fortes e batiam os galhos secos das árvores mortas nas pedras dos muros da construção, fazendo barulhos que pareciam de ossos se quebrando. As poucas e rubras folhas que ainda resistiam sangravam e eram levadas ao chão. Flâmulas e roupas nos varais tremulavam como as almas penduradas nos ferros ao açoite dos infernos. Portas e janelas deixadas abertas batiam furiosamente como o chicote do gordo nas horas de castigo (de algum criado) e prazer (para ele).

Inclemente, a tormenta já pairava há três dias sobre o castelo. As suas fundações sucumbiam e, agora, pareciam que eram feitas de barro. Pedra após pedra começavam a se soltar e cair na terra encharcada. O som das estruturas entortando e ruindo se confundia com os trovões incessantes.
O gordo não tinha mais como se iludir e finjir que nada estava acontecendo. Gritou e chamou por seus súditos para que providenciassem o que fosse preciso para manter a construção de pé.
Mas já era tarde demais.
Não havia mais o que consertar, os estragos no castelo eram mortais e definitivos. Não havia mais quem consertasse o que quer que fosse, toda a criadagem já tinha fugido na calada da noite, na certeza da tragédia inevitável.

O gordo sentou em sua poltrona.
Ele estava só na sua fortaleza, que não era mais.
Só, como sempre esteve, mesmo cercado da gente que ele menosprezava.
Só, como um castelo castigado pela tempestade.
E o castelo sucumbiu.
E o gordo sucumbiu.
Um e outro.
Um.


Texto e imagem de Ilvan Filho

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